domingo, janeiro 31, 2016

No Rio Paraná e numa casca do ovo

Quando, numa viagem a Bonito, passei pelo Rio Paraná, senti uma energia diferente vinda daquele lugar. O nome da cidade de Presidente Epitácio me lembrou uma historia que minha mãe contava quando eu era pequeno e que me fascinava pela grandiosidade da aventura. Minha mãe chamava a cidade de "Porto Epitácio" não sei exatamente porque. Imagino que, antes de existir a ponte que liga São Paulo a Mato Grosso do Sul, só se atravessava o grande rio de balsa ou de barco a motor e que ao invés da imponente Ponte, havia um porto onde as pessoas pegavam a balsa. Você ja deve estar curioso pela historia não é? Então vamos a ela. Minha mãe, só para explicar porque a historia era para mim uma historia fantástica e, para quem não sabe, era para plégica e andava de muletas. Ela me contou que meu pai as vezes dava uma sumida no mundo para trabalhar em outras terras e que uma dessas sumidas foi quando ele foi trabalhar para um irmão que ele tinha em Mato Grosso. Ele deixou minha mãe em São Paulo, sempre dizendo que ia arrumar trabalho e que a levaria depois para onde estava e foi trabalhar na lavoura de algodão. Foram tempos duros queles, nos idos de 1950. As coisas estavam difíceis e minha mãe passou a morar com uma de  minhas tias.
Ela costurava para fora e quando os clientes iam pagar o que ela cobrara pela costura, minha tia entrava na frente e pegava todo o dinheiro e não dava nada para ela. Ela comia, dormia e permanecia na casa desta tia por falta de opção. Passou uns perrengue e até fome, porque minha tia vigiava tudo o que ela comia e as vezes dava-lhe pouca comida. Um dia, ela se cansou de tanto esperar por meu pai e de passar apertos e, com meu irmão pequeno no colo(eu ainda não era nascido) resolveu ir para Mato Grosso atras do meu pai. Agora, imaginem, se, para uma pessoa normal, sem dinheiro e com um filho pequeno já seria dificil ir de São Paulo Capital a Mato Grosso, pensem nisto colocando a deficiência de minha mãe que andava de aparelho ortopédico e muletas. Mas não foi esta dificuldade que a impediu de ir até meu pai. Pegou o que pode, uma trouxinha com roupas, meu irmão e lá se foi ela para a rua. Pediu carona e foi caminhando em direção ao seu objetivo. Subiu em boleias de caminhões onde os motoristas, verdadeiros anjos, tiveram que lhe colocar em cima do banco, pois ela não conseguia subir. Chegou em fim, depois de muita estrada na beirada do Rio Paraná. Olhou a imensidão daquele rio. Teve um pouco de medo, pois um acidente qualquer que ocorresse lhe seria fatal, pois não sabia nadas e, naquele tempo, nem se pensava em dar coletes salva-vidas as pessoas que atravessavam de barco. A balsa era muito cara e ela estava sem dinheiro. Conseguiu então um pescador que tinha um barco a motor que lhe levaria de graça para o outro lado. Olhou o barco, comparou com o rio, dominou o medo e foi. Entrou naquele barco e pensou: Se Deus quiser me lavar hoje, estou pronta, mas morro tentando ser feliz. Durante a travessia ela se viu num marzão sem fim de agua doce e, comparando o barco em que estava com o tamanho do rio me disse quando cotava a historia: Eu parecia estar numa pequena casca de ovo no meio do mar sem fim. Esta viagem toda foi para ela um encontro com o divino. O deus que há nas pessoas que a levaram até ali, os anjos que a alimentaram durante o trajeto e a seu filho. O anjo pescador que a atravessou naquele rio enorme, barreiras intransponíveis para alguns, não para ela. Do outro lado do rio ela agradeceu ao pescador e a Deus por ter conseguido chegar até ali. Dali para a frente seguiu no lombo de uma mula com seu filho montado a frente, sempre guiada pela mão invisível de Deus que a levava através das pessoas caridosas que foi encontrando. Seguiu trilhas por léguas e assim chegou no local onde meu pai havia dito que estaria.
Quando a viu, meu pai ficou muito feliz e demorou a compreender como o amor de uma pessoa pudesse traze-la de tão longe em tão difíceis condições. Ela morou com ele numa tapera de madeira coberta de sapé por um bom tempo e preferiu mil vezes estar ali do que ficar longe de meu pai. Mesmo que ali também passasse fome junto com ele, estava com seu amado e sua família. Ela me contou que meu pai dera a ela uma pequena garrucha, uma arma pequena, para que atirasse em algum bicho que porventura entrasse na tapera, ja que ela não podia correr. Ela tinha mais medo de atirar com a arma do que dos bichos. Foram várias as vêzes em que cobras vinham, entravam na tapera e ela ficava imóvel esperando os bichos irem embora, mas nunca teve coragem de atirar nelas. Elas as vezes passavam em seu colo, mas ela se apegava com Deus e orava uma oração de proteção que mandava as cobras embora sem lhe fazerem nenhum mal. Tem outras historias que ela me contava sobre um loro que chamava meu pai na roça quando ele tinha que vir comer gritando: (Isaias era o nome do meu pai) Zaía, vem almoçá! Este pobre loro acabou caindo numa panela de sabão fervente e morreu. Tinham também as histórias dos macacos que tinham os olheiros e que vigiavam para que meu pai não pegasse o bando de surpresa no milharal. Certo dia, meu pai os pegou de surpresa e o "olheiro" apanhou pacas dos outros macacos... Ela achou isto muito engraçado. Bom, esta é a historia de hoje. Espero que tenha gostado. Se gostou, comente pra eu ficar sabendo que você esteve aqui e compartilhe no seu face por favor.

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